A luz, como elemento fundamental para o mecanismo de visão, é essencial na caracterização de um ambiente. Mas para além da simples questão de ver o que nos rodeia, as características da luz num determinado ambiente tem a capacidade de desencadear respostas físicas, biológicas e psicológicas no ser humano.
 
A luz tem, portanto, a capacidade de por si só afetar a perceção de um espaço e, por conseguinte, a experiência vivida no mesmo. Ainda que, num determinado espaço, nada se altere para além da luz, as sensações por este transmitidas podem ser totalmente distintas: um ambiente festivo pode passar a ser um de introspeção e relaxamento; um ambiente confortável pode tornar-se, por sua vez, intimidativo: daí a importância do Design de Iluminação.
 
Em Arquitetura, ou Design de Interiores, o estudo da luz assume-se como fator essencial. A luz hierarquiza, conduz a atenção, revela o espaço e revela as suas características. Em função de determinados fatores da luz, como por exemplo a temperatura de cor, a intensidade ou a altura da fonte de luz a que estamos expostos, o nosso ritmo circadiano sofre alterações que influenciam o sono e o metabolismo. E se queremos estar ativos no nosso local de trabalho, procuramos a calma e a tranquilidade na hora de dormir.
 

 
Se até há poucas gerações atrás, a vida quotidiana se regia em função dos ciclos de dia e noite – luz e escuridão -,  a vida contemporânea – desde a Revolução Industrial -, com o advento da luz artificial, veio alterar as rotinas, expondo-nos durante várias horas à luz artificial. É, por isso, de grande importância a atenção ao estudo da luz – natural e artificial –  integrado no desenho dos espaços.
 
Uma das melhores formas de exemplificar a sua influência é através do cinema. A luz é um dos elementos chave usados para definir e comunicar a atmosfera de um filme: e como vivemos senão em cenários da vida real.
 
Foi no início do século passado que a iluminação artificial começou a desempenhar um papel fundamental no cinema, essencialmente na Europa, com o Expressionismo, o Impressionismo e o Realismo Poético. Com origem nos grupos Der Blaue Reiter e Die Brucke, o Expressionismo marcou o cinema até aos dias de hoje. Uma das obras-primas dessa época foi o muito conhecido Nosferatu de Murnau (1922): ainda sem o recurso à cor, contando apenas com contrastes de luz e sombra, cenas de suspense e tensão eram perfeitamente transmitidas.
 

 
Por outro lado, no filme Rear Window, de Hitchcock (1954), a criação de cenários de luz baixa foi essencial para manter o ambiente de suspense das cenas, para realçar o lado sedutor da atriz Grace Kelly (que dava vida a Lisa Fremont) e até como – spoiler alert – o protagonista se defende do seu atacante através de uma sequência de luz de flash da sua máquina fotográfica, provocando encandeamento.
 
É a partir do conhecimento do resultado da luz num determinado espaço (cénico ou quotidiano), e do conhecimento do modo em como essa mesma luz seria interpretada, que o designer de iluminação trabalha, criando assim os ambientes desejados, num exercício de aplicação das técnicas e conhecimentos científicos, definidos e mensuráveis, de modo a criar o ambiente com os estímulos desejados. O designer recorre a técnicas de cálculo de modo a prever o comportamento da luz (intensidade, refletividade, cor…) num determinado espaço, estuda as características das fontes luminosas, define posição, orientação e altura de cada fonte de luz – em posições de integração com os demais elementos do edifício – de modo a obter o resultado desejado: a valorização da arquitetura, dos espaços e dos ambientes nele integrados. Esta constante viagem entre as duas vertentes, a racional e a emocional, procura-se o ideal: um espaço valorizado e potenciado, pela luz.
 

 
A luz tem assim esta dualidade: encontra definição científica perfeitamente definida e passível de ser controlada e quantificada, mas é entendida de um modo também subconsciente, estimulando e influenciando a qualidade da vivência do ser humano nos seus ambientes iluminados.
 
“Experiências psicológicas (…) concluem que 87% das percepções humanas são percebidas através dos nossos olhos (…). Logo, a acção propositada e acidental da luz na criação da perceção visual determina sete oitavos do impacto total do trabalho arquitectónico e decorativo.” – Richard Kelly in “Light as an integral part of architecture”
 
 
 
 
Nota:
*Título do livro de Ricardo M. Salmón